segunda-feira, 31 de março de 2008

Peixe de plástico?

Passei o último domingo na Ilha das Flores. Churrasco, pescaria no Guaíba, passeio de barco. Em meio às atividades dominicais, me impressionou profundamente a criatividade e jogo de cintura dos moradores, em sua grande maioria pescadores, na construção de suas casas. São muito simples, pequenas, feitas por eles mesmos, verdadeiros mosaicos de itens que vão sendo encontrados pela cidade, ou comprados a preços baixos no comércio de usados.

A sucata é muito presente nas soluções do dia-a-dia dos humildes pescadores. No banheiro da casa em que estive, a extremidade da cordinha da caixa de descarga era feita com uma tampinha vermelha de garrafa pet. Recipientes plásticos se transformavam nos mais variados fins como vasos de flor e baldes.

O reaproveitamento de sucata, especialmente o plástico, não é somente uma realidade da população pobre da Ilha das Flores. Quantas vezes vemos na televisão um senhor de classe média que construiu banquinhos para a sala com garrafas pet, ou as senhoras do Clube de Mães que produziram brinquedos para doação? No último Natal Luz de Gramado, foram arrecadadas 100 mil garrafas para a decoração das ruas da cidade!

Concordo na reutilização de sucata, especialmente no caso das pessoas humildes, em que não há outra saída a não ser esta, mas não concordo com o papel da mídia e das instituições de educação e formação de opinião, no momento em que exaltam como "ecologicamente correta" a atitude de construir novos objetos a partir de garrafas pet. Esta questão deveria ser tratada com um outro viés, no sentido de não consumir tanto plástico, de reduzir ao máximo a necessidade de plástico no cotidiano. Sites como este estimulam não à diminuição de nossa dependência dos derivados de petróleo, mas a um consumismo um tanto que absurdo, direcionando ao leitor a possuir cada vez mais garrafas pet para construir puffs cada vez maiores:

"Se você é do tipo que adora dar aquela ajudinha para natureza, inventando objetos criativos e úteis, essa é uma boa dica! Além de lindo, o puff de garrafas pet é ecológico. Só em um modelo pequeno, de aproximadamente 50 centímetros, você utiliza 16 garrafas pet. Esses números podem aumentar de acordo com a sua criatividade"

Ou como no caso
desta notícia, que, após mostrar um (Lindo? Útil?) peixe produzido a partir de garrafas pet, descreve os grandiosos lucros da indústria de reciclagem de plástico. Sim, reciclar é preciso, mas devemos ir além disso, muito mais além que somente reciclar ou reutilizar. É necessário despertar consciências para a redução de nossa dependência da indústria de exploração de petróleo.

Há dois anos atrás, quando fui aluna da disciplina Jornalismo Ambiental, a professora Ilza Girardi nos apresentou o ambientalista e engenheiro agrônomo Jacques Saldanha. Ele alerta para os perigos que determinados tipos de plástico podem acarretar à saúde, especialmente o PVC (policloreto de vinila), encontrado nos plásticos “filme” para embalar alimentos e nas tradicionais tubulações de água presente em simplesmente todas (ou quase todas) casas brasileiras. (Tubos e conexões Tigre, o que são? Tubos de PVC!) A questão do PVC é o produto a ele adicionado para conferir as características físicas do plástico, como maleabilidade e maciez, ou seja, para diferenciar o produto que embala seu brócolis do produto presente nos canos de água da pia de sua cozinha. O Greenpeace publicou em 2001 um estudo preocupante sobre a utilização de PVC em produtos infantis.

O livro O Futuro Roubado apresenta diversos casos em que agentes químicos, presentes também no plástico, causam problemas ambientais e humanos como queda no número de espermatozóides, alterações no comportamento sexual e deformidade genital. No caso dos plásticos, estas alterações são causadas pelos xenoestrogênios (mais informações aqui), um formato sintético do hormônio presente no organismo, gerado pela indústria petroquímica na produção de plásticos, agrotóxicos e solventes.
É inviável tornar a vida de hoje independente dos produtos petroquímicos. Eletroeletrônicos, eletrodomésticos, automóveis, produtos de limpeza e beleza... a vida diária tem como matéria prima o "sangue negro", como diz a tradução do título do vencedor do Oscar 2008 de melhor ator e fotografia, There will be blood. O segredo, acredito, é colocar limites na indústria, preferir sempre a embalagem de vidro, refutar o PVC. Porque tampinha de garrafa no puxador da descarga de uma casa humilde, vá lá, mas peixe de garrafa pet e chimarrão em cuia de plástico, ah, é demais, meu amigo.

6 comentários:

Curiosa disse...

Muito interessante seu post, Emanuela. Confesso que nunca tinha pensado na reciclagem dessa forma.

É meio estúpido ainda estarmos usando TANTO plástico. Na Alemanha o leite e o refrigerante são vendidos em garrafas de vidro, as quais, posteriormente, podem ser trocadas por um vale (isso no próprio supermercado). (E vejam bem, os alemães não devolvem as garrafas porque são ecologicamente corretos, e sim por que recebem algo em troca...).

Anônimo disse...

pois funciona da mesma forma o raciocínio das bolsas "não sou de plástico" e de umas camisetas feitas de algum plástico reciclado (que li em algum momento da vida que existiam). Não é mais fácil fazer a sacola de pano de uma vez, para diminuirmos o consumo de plástico?
O problema é que agora ser ecologicamente correto tá na moda e comprar uma sacola de pano que não tenha plástico na composição não dá ibope.

Maria Clara Spies disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Maria Clara Spies disse...

é meio controversa essa história de artesanato a partir do uso de recicláveis, penso que é válido se usar aquilo que já consumimos, porque, sejamos realistas, a conjuntura do Brasil no que tange às políticas ambientais certamente é bastante diferente das da Alemanha, ou alguém acredita que receberemos qualquer vale em troca de nossas garrafas?

Mas, se tivermos que consumir sempre mais para ter matéria prima suficiente, seria uma deturpação da finalidade daquilo a que se propõe realizar determinado tipo de artesanato, dar uma nova utilidade àquilo que seria considerado lixo e descartado como tal.

Assim sendo, para mim não há, a priori, nenhum problema em fazer puffs ou peixes...

Paulinho Azevedo disse...

Muito interessante este post. Já tinha visto várias matérias sobre o reaproveitamento de garrafas pet e nunca tinha me dado conta do paradoxo que é estimular esse tipo de ação. É claro que é preciso reciclar, mas como diz o post, não faz sentido incentivar o uso de produtos plásticos.

Juan disse...

Todavía no puedo creer que no sé por dónde empezar, me llamo Juan, tengo 36 años, me diagnosticaron herpes genital, perdí toda esperanza en la vida, pero como cualquier otro seguí buscando un cura incluso en Internet y ahí es donde conocí al Dr. Ogala. No podía creerlo al principio, pero también mi conmoción después de la administración de sus medicamentos a base de hierbas. Estoy tan feliz de decir que ahora estoy curado. Necesito compartir este milagro. experiencia, así que les digo a todos los demás con enfermedades de herpes genital, por favor, para una vida mejor y un mejor entorno, póngase en contacto con el Dr. Ogala por correo electrónico: ogalasolutiontemple@gmail.com, también puede llamar o WhatsApp +2348052394128